"ENTRE NÓS E AS PALAVRAS,
O NOSSO DEVER DE FALAR"
Mário Cesariny, in:Pena Capital
Há muitos muitos anos, era eu professor de música, e enquanto alguns brincavam ao baloiço e ao pião, eu ensinava a cantar o Hino Nacional.
E já nessa altura, não só as crianças, mas muito mais eu próprio, achava que o Hino (por muito respeito que lhe tenha), sofre de algumas doenças.
A linha melódica, alarga-se por uma tassitura, que a torna de difícil execução, quando cantado.
Ainda há dias o Dr. Marcelo de Sousa se esforçava por o cantar, mas a verdade é que, não só ele, mas a maioria não cantam o Hino Nacional em condições de ser um verdadeiro Hino Patriótico.
A Isabel Silvestre, que muito aprecio pela voz pura, no seu último trabalho, (precisamente: A Portuguesa) canta-o perfeitamente, mas no entanto, ela dá-lhe uma ternura e uma suavidade que não se condizem com a bravura dum Hino Nacional.
Mas pior que a linha melódica, é a letra, que usa palavras demasiado cultas, algumas caídas em desuso, como p. ex. egrégios.
Mas pior que isso é o final, com um convite às armas, numa época em que todos devíamos gritar Paz.
Além disso, incitando a marchar contra os canhões. Ora, dá a impressão que, quem escreveu seria militar, e dum posto superior, (que só manda e não vai) pois hoje não vamos mandar ninguém contra os canhões,que seria morte certa. Além disso, hoje, falar de canhões é quase falar de museus.
Um amigo, professor e organista da Universidade de Coimbra, chama-se Joel Canhão. Já temos discutido este aspecto, e humoristicamente ele diz que ainda um dia se vai chamar Joel Misssil, para ficar um pouco mais actualizado.
Foi pensando nisto que um dia em viagem me lembrei de cantarolar qualquer coisa, e que escrevi.
Em tempos enviei-o para o nosso anterior Presidente Mário Soares.
Não pretendo substituir o nosso Hino Nacional. Simplesmente, levantar a questão sobre se será ou não correcto continuarmos a ter um Hino, que preze a qualidade do mesmo, não consigo cantar, se quiser ter um mínimo de coerência com as minhas convicções pacifistas.
Eu já me tinha esquecido deste meu Hino. Mas esta semana passada, fartei-me de ver na Televisão, no rali Dakar-Dakar, um camião com a palavra HINO.
E voltou-me à memória uma frase diferente:
Hoje é o primeiro dia do resto deste meu HINO....